Salvador tem cerca de sessenta anos, é arquitecto. A esposa, Mariana, professora, agoniza à espera da morte, com cancro. António, irmão de Salvador, doente psiquiátrico, é um ex-combatente, à beira da loucura, com trauma de guerra. O pai de ambos é o homem que segurou os cordéis dos fantoches em que transformou os filhos. Por isso, perante António, é-nos difícil perceber se o maior trauma é a guerra ou o pai.[Image]O aspecto mais interessante desta obra é a sua estrutura, bastante original: inicia-se no presente, dirige-se para o passado e depois regressa ao presente, aquando da morte de Mariana. No entanto, fica a sensação de que Rodrigo G. de Carvalho poderia ter conseguido algo mais. Tem talento, a sua escrita é atractiva mas parece ter faltado um pouco de arrojo para construir o seu próprio estilo. As influências de A. Lobo Antunes são demasiado óbvias e o enredo aproxima-se constantemente das fronteiras do cliché. Como magnífico jornalista que é, Guedes de Carvalho revela uma admirável capacidade de expressão que lhe permitirá certamente empreender obras mais arrojadas.Não deixa de ser interessante neste livro a análise da figura paternal – o pai que julga resolver tudo com dinheiro e que “força” os filhos a uma carreira de sucesso e o próprio António, filho desprezado, que se transforma em pai ausente, advogado com graves problemas psiquiátricos e que se esquece de ver os filhos crescer.Enfim, um livro que me desiludiu um pouco e que arrasta, ao longo das suas 260 páginas uma tristeza, uma melancolia profunda que não é, como em Lobo Antunes, servida por uma linguagem poética capaz de compensar esse tom lúgubre.
Também publicado em http://aminhaestante.blogspot.com/
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