12/03/2011

Inês de Castro - Maria Pilar Queralt del Hierro

A lenda (e/ou a história) de Inês de Castro contada por uma escritora espanhola. Foi a curiosidade por conhecer uma versão castelhana que me levou a ler este livro. E em boa hora o fiz. Depois de tantas vezes contada, era difícil fazer algo diferente sem fugir à realidade histórica e à “verdade” que a lenda perpetuou. Mas Queralt del Hierro” consegue-o de forma muito interessante.
O que mais me encantou nesta forma de contar a história foi o facto de a autora ter incidido toda a narrativa no papel feminino.
Na minha opinião, a melhor narrativa desta lenda foi feita por João Aguiar (Inês de Portugal) e nessa obra, o grande romancista português centra todo o enredo na figura do rei D. Pedro, na sua paixão violenta, no seu carácter justo mas irascível e na amizade com o seu escudeiro Afonso Madeira.
Esta escritora espanhola, pelo contrário, escolhe para epicentro da história a relação de amizade entre D. Constança e Inês; uma amizade pura e intensa que, de facto, não havia sido suficientemente esmiuçada pelas versões portuguesas. Esta análise chega a ser de uma profundidade psicológica notável, recuando até à infância das duas para melhor explicar as paixões que haveriam de determinar os seus destinos.
D. Constança é vista neste livro como uma verdadeira heroína que manteve até ao fim a fidelidade a uma amizade de infância. Só isto explicaria um dos grandes enigmas que a lenda deixara em aberto: porquê o interesse permanente de D. Constança em ter Inês perto de si, mesmo sabendo da paixão que esta nutria pelo seu esposo, paixão aliás correspondida? Na verdade, só a amizade justificaria tal conduta.
Mas a incidência deste livro no feminino não fica por aqui: é interessante verificar como a autora encara as freiras de Santa Clara como verdadeiras heroínas do amor ao condescender com o amor carnal que Pedro dedicava a Inês, pactuando com os seus encontros escaldantes em plenos aposentos do convento.
Um outro aspecto interessantíssimo é a forma como Del Hierro introduz na história Teresa Lourenço (a última paixão de D. Pedro, após a morte de Inês). Esta mulher viria a ser a mãe do grande herói da história de Portugal que foi o rei D. João I, Mestre de Avis) e entra nesta narrativa como uma autêntica heroína, ao lado do rei justiceiro.
Em suma, trata-se de uma versão original e muito interessante de um dos temas mais encantadores da História de Portugal. Vale a pena ler, se bem que esta edição de 2004 já ande um pouco perdida pelas estantes mais recônditas das livrarias. É pena…

3 comentários:

Cristina Torrão disse...

Sem dúvida, um tema interessante. Que devia ser abordado mais vezes, em romances deste tipo, de maneira a desmantelar o mito e a lenda que se criaram à volta dos amores de Pedro e Inês. Muito haverá a dizer sobre a verdadeira importância de Inês de Castro na vida de D. Pedro e, principalmente, sobre o papel de D. Afonso IV. E sobre as razões que levaram D. Pedro a coroar a amante depois de morta (interessante, do ponto de vista psicológico).

Unknown disse...

Sem dúvida, Cristina. Este assunto é encantador precisamente porque a lenda se mistura de tal maneira com a realidade histórica que deixa de haver limite entre a ficção e a História.
Mas para lá disso continuo a pensar que a ficção portuguesa tem de explorar mais o romance histórico. Com uma história tão rica como a nossa é quase-crime desperdiçar tal filão

Cristina Torrão disse...

Sem dúvida, Manuel!