Nunca ninguém me há-de convencer que se fala demasiado do Holocausto Nazi. Relembrar estas situações, em que a maldade humana foi levada um extremo inimaginável, será sempre, a meu ver, uma necessidade. Para que a memória ainda possa evitar que a loucura de alguns seres humanos atinja estas proporções...
A insanidade nazi provocou situações que, sem dúvida, serão sempre terreno fértil para escritores e cineastas. Infelizmente, na maior parte dos casos encaminhou-se esta base histórica para a exploração fácil da violência nos ecrans e até nos livros. Mas não tem de ser assim. Recentemente, O Leitor foi um exemplo magnífico de como ainda é possível fazer leituras profundamente humanas e ver perspectivas novas no contexto do Holocausto. E este é mais um exemplo.
O que este livro tem de mais interessante é, na minha opinião, o de nos mostrar o lado dos alemães na guerra. O nosso herói, Bruno, de nove anos, é filho do comandante de Auschwitz (Acho-Vil no dizer ingénuo da criança). O pai é um dos favoritos de Hitler, o Fuher (O Fúria para Bruno) e tenta esconder do jovem tudo o que se está a passar relativamente ao extermínio dos judeus. Assim, é por si próprio, nas suas explorações infantis, nas suas brincadeiras ingénuas que Bruno se vai aproximando da terrível verdade que o rodeia.
Shamuel nada sabe porque nada lhe dizem, mas quem será realmente ignorante? A criança a quem nada se diz ou todos aqueles que julgam ser detentores das verdades absolutas e nada sabem dos outros, dos que consideram inferiores? A pior ignorância não será a que vem disfarçada de verdades inabaláveis?
No campo da morte, junto à vedação que ele conhece pelo lado de fora, é Shamuel, o amigo do pijama às riscas que o vai acompanhar nessa horrível descoberta. Mas os dois meninos vivem mundos diametralmente opostos. No entanto, algo de monstruoso os irá encaminhar para um destino comum.
Bruno é a criança inocente que, como tantas outras, é vista pelos adultos como um ser menor. E quantos de nós, adultos não caímos tantas vezes neste mesmo erro, de considerar a criança como um ser inferior, que não precisa de saber a verdade das coisas, de quem se pode esconder tudo?! Tanta ingenuidade, a nossa. A criança não é um adulto incompleto; e que bom seria se nós próprios conseguíssemos apreender de vez esta ideia.
Junto à vedação, Bruno inveja Shamuel porque embora enclausurado, tem muitos amigos. Bruno, o menino rico, protegido e a quem nada falta é o menino infeliz e solitário. Mais um “recado” para nós: o que damos nós às nossas crianças? Dinheiro e mentiras?
Gostava ainda de chamar a atenção para o final do livro. Considero-o absolutamente genial. Genial na forma como é construído, com um contexto de suspense que prende o leitor até ao fim mas também com uma carga simbólica extraordinária. Um final dramático e belo ao mesmo tempo. Porque na mais profunda tristeza também há beleza.
Um livro genial. A par de O Leitor, trata-se de um dos melhores romances escritos nos últimos anos sobre este tema (infelizmente) sempre actual.
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