Neste livro, Orhan Pamuk faz uma compilação de seis conferências que deu na prestigiada Universidade de Harvard. Nestas conferências, o autor debruça-se sobre o romance, o género literário que registou uma grande evolução ao ponto de suplantar todos os demais, a começar pela poesia. Pamuk descreve-nos os sentimentos e as reacções que as pessoas têm ao ler romances através da sua experiência de quarenta anos como ávido leitor deste género literário. O que se passa na mente das pessoas quando estão a ler um romance? O autor defende que, quando estamos a ler um bom romance, parte da nossa mente está imersa em realidade. Pelo lado contrário, pelo do escritor, mostra-nos também como os seus trinta e cinco anos como romancista o ajudaram a conseguir interpretar os romances de outros escritores. Toda esta experiência acumulada ao longo da vida o ajudou a evoluir como romancista.
A sua abordagem em que faz uma comparação do romance com outras artes é deveras interessante, o romance como que “inveja” a pintura por ser uma arte em que é mais fácil às pessoas a visualização de imagens. Esse processo, nos romances, é mais difícil de conseguir mas deveras gratificante quando alcançado.
O ponto de partida para as suas conferências é o ensaio de Schiller “Sobre a poesia ingénua e a sentimental”, considerado por Thomas Mann “o mais belo ensaio escrito na língua alemã”. Por analogia, Pamuk começa por dividir os escritores de romances entre ingénuos e sentimentais. Todos estes termos e outros utilizados ao longo do livro são-nos explicados com recurso a escritores e romances que marcaram o autor ao longo da sua vida. Aqui ficamos a conhecer o maior romance de todos, “Ana Karenina” de Tolstoi, aqui ouvimos falar de “À procura do tempo perdido”, de Proust, D. Quixote, de Cervantes, “Os demónios” e “Os irmãos Karamazov”, de Dostoievski, de Thomas Mann, James Joyce, Stendhal ou Faulkner, entre outros.
Não querendo desvendar demasiados pormenores focados pelo autor, não posso deixar de mencionar um termo que é analisado extensivamente ao longo do livro pois pode considerar-se o ponto fulcral do romance – o seu “centro”. O centro do romance é, para Pamuk, a mensagem que o autor pretende passar aos seus leitores, é a visão do mundo que o autor tenta fazer passar através das suas personagens. É como uma pintura que nos permite visualizar cada árvore até chegarmos à visão do conjunto, que constitui a floresta. O centro de um romance é a procura, por parte do leitor, página a página, pormenor a pormenor, da mensagem que o autor como que oculta. Este processo assemelha-se a um jogo de xadrez entre leitor e escritor pois, enquanto prazer que o leitor conquista gradualmente ao longo das páginas, o romancista, por seu lado, não quer que o mesmo seja demasiado óbvio mas também não quer tornar essa procura num processo demasiadamente complexo.
Não sendo um livro muito extenso lê-se com prazer, pessoalmente houve capítulos que li duas vezes, pois, enquanto leitor, é fácil identificarmo-nos com certos pormenores aqui descritos. Poder-se-á considerar este livro um ensaio sobre o romance, onde se aborda a sua evolução como género literário dominante, onde o autor compara a cultura ocidental e a oriental e nos descreve essa ligação apaixonante leitor/escritor em que o autor tenta mostrar-nos a sua visão do mundo fruto das suas vivências e experiências pessoais e o leitor com a sua tendência natural de considerar o autor como um espelho das suas personagens.
Para Pamuk, tanto o acto de ler como o de escrever devem estar em equilíbrio entre os dois conceitos centrais mencionados anteriormente, o “ingénuo” e o “sentimental”, qualidades estas que se complementam e fazem deste género literário o veículo utilizado por excelência por todos os predestinados que nos quiseram mostrar o mundo através das suas obras imortais e intemporais.
ORHAN PAMUK nasceu na Turquia, em 1952. Começou por estudar Arquitectura, mas acabou por se licenciar em jornalismo pela Universidade de Istambul, profissão que nunca exerceu. Grande estudioso e leitor insaciável, escreve desde os 23 anos, uma actividade que o tornou conhecido em mais de 50 países e que lhe valeu inúmeros prémios e distinções. Em 2006 foi agraciado com o Nobel da Literatura. A sua obra é seguida com o maior interesse tanto no mundo ocidental como na própria Turquia, onde os seus livros são sempre bestsellers, apesar das suas posições críticas em relação à política do seu país. As suas obras encontram-se traduzidas em 60 línguas.
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