CRÓNICAS
DE UM PORTUGAL DEMASIADO PORTUGUÊS
GRAÇA
– PARTE VIII
(Nota: qualquer semelhança entre o conteúdo deste texto e a realidade continua a ser, obviamente, pura coincidência, exceptuando desportistas, artistas e comediantes profissionais ou amadores)
No
outro dia estive com um exame de 12º ano de Português nas minhas
mãos. Conclusão? Fiquei chocada. Li e reli por diversas vezes e
logo me reuni com o meu staff.
Durante longas horas estivemos enfiados dentro de quatro paredes -
sim, os políticos abdicam das suas vidas pessoais em prol do seu
povo - e, no final, entendi que tinha gritado durante metade do
tempo.
Achei
inadmissível o caminho que se seguira até então.
Decidi
pois que muita coisa teria de mudar. Muita mesmo. Como querem os
governantes que os alunos queiram aprender quando tudo o que lhes dão
acaba por ser matéria obsoleta? Eles não querem saber de onde
vieram! Querem saber para onde irão!
Fiz
valer então o meu ponto de vista.
Primeiro.
Fernando Pessoa. O que há que ensinar sobre um gajo que não sabia
quem era? Risquei-o logo da matéria. Alguém que ora se chamava
Álvaro ora Ricardo não podia ser exemplo para esta nação.
Segundo.
Luís Vaz de Camões. Tendo em conta que só tinha um olho não podia
ter uma visão abrangente dos assuntos, certo? Pelo menos só viu
metade do que aquilo que uma pessoa, chamemos-lhe, normal consegue
detectar. Como podia ele falar de uma sociedade quando só via da
esquerda até ao ângulo que o seu nariz permitia? Assim, parte do
que se passava à sua direita era-lhe desconhecido. Conclusão?
Camões nunca mais.
Terceiro.
José Saramago. Esse senhor era um extremista, logo seria impossível
que vivesse em comunidade. Outro que arrumei para canto.
Perguntaram-me então porque tinha ganho um Nobel. Bem, num laivo de
raiva despedi quem fez a questão - não obstante se tratasse do
primo da minha tia Zira que tinha largado a profissão de coveiro
para se juntar à minha assessoria - e expliquei que esses prémios
estavam cheios de cunhas, não sendo por isso idóneos.
Quarto.
Luís Sttau Monteiro. Também o eliminei da matéria a leccionar para
o ano vindouro. Escreveu 'Felizmente há luar' e esse título não é
compatível com a nossa política. Luar, lembra noite, que por sua
vez me faz pensar em escuridão. Pois o nosso governo bem que pode
dispensar o negativismo típico dos portugueses.
Depois
analisei a matéria praticada no 11º ano. Um novo desastre.
“Os
Maias”? Quem precisa de saber tudo sobre decoração de tempos idos
quando o novo design
das habitações está acessível na Internet? Além do mais, isto de
criticar a sociedade também já passou de moda.
“Frei
Luís de Sousa”? Que importa saber de um personagem esquizofrénico
que nem sabe a sua identidade mas que tem a mania que é D.
Sebastião? Nós precisamos é de ver a luz ao fundo do túnel.
E
foi a medo que peguei nos assuntos abordados no 10º ano.
Com
desilusão, percebi que estavam lá poemas de gajos que nunca fizeram
nada na vida. Levantei-me e disse para todos:
Olhai
para mim a ser poetiza,
de
tal forma que já estou cheia de fome
tu,
Bernardo, manda vir uma piza
que
é só ires ao site mandavir.com
O
pessoal do staff ficou a encarar-me e eu acabei por me sentar,
pensando em todos os disparates que os anteriores ministros da
educação fizeram antes de mim. Voltei a explicar que era necessário
cativar os jovens com matéria do mundo real e actual e,
principalmente, com assuntos que eles sentissem que fizessem parte
deles.
Por
isso, não saímos de lá enquanto não decidi o que se haveria de
leccionar a curto prazo.
As
obras obrigatórias passariam a ser as biografias das vidas de José
Mourinho e Cristiano Ronaldo, assim como dissertações acerca dos
Xutos & Pontapés, do Boss AC, da Teresa Guilherme e do Herman
José. Depois ordenei que as composições incidissem sobre a
Playstation e a Nintendo. Como poesia, propus as letras da Ágata, do
Quim Barreiras e da Miley Cyrus - não que tivesse alguma ligação
com Portugal, mas porque Ana, de Hannah Montana, é um nome muito
comum por estas bandas, logo o reflexo de muitas jovens. Mas como
nem tudo hoje em dia é cultura pura, da forma como sempre
conhecemos, também coloquei no programa episódios da vida de gente
que ajudou a sejamos aquilo que hoje somos, como o Marco e o Zé
Maria do Big Brother, o Zé Cabra da fatiota de lantejoulas, o
Hélio que se atira dos skates ou o José Castelo Branco para aqueles
que não se identificam com ninguém e se julgam extraterrestres.
Para além disso, existirá uma matéria livre sobre o telemóvel
que, nos tempos que correm, é aquilo que todos os rapazes e
raparigas desejam.
Portanto,
tratarei de tornar Portugal num país voltado para o futuro e
detentor de jovens dinâmicos e capazes de serem bem-sucedidos por
toda a parte.
1 comentários:
A nossa sociedade portanto, em que os "jovens" nem sabem, nem querem saber... o que importa é a me... que aparece na tv !
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