10/09/2013

CRÓNICAS DE UM PORTUGAL DEMASIADO PORTUGUÊS


CRÓNICAS DE UM PORTUGAL DEMASIADO PORTUGUÊS
 
GRAÇA – PARTE VIII
 
(Nota: qualquer semelhança entre o conteúdo deste texto e a realidade continua a ser, obviamente, pura coincidência, exceptuando desportistas, artistas e comediantes profissionais ou amadores)
 
No outro dia estive com um exame de 12º ano de Português nas minhas mãos. Conclusão? Fiquei chocada. Li e reli por diversas vezes e logo me reuni com o meu staff. Durante longas horas estivemos enfiados dentro de quatro paredes - sim, os políticos abdicam das suas vidas pessoais em prol do seu povo - e, no final, entendi que tinha gritado durante metade do tempo.
Achei inadmissível o caminho que se seguira até então.
Decidi pois que muita coisa teria de mudar. Muita mesmo. Como querem os governantes que os alunos queiram aprender quando tudo o que lhes dão acaba por ser matéria obsoleta? Eles não querem saber de onde vieram! Querem saber para onde irão!
Fiz valer então o meu ponto de vista.
Primeiro. Fernando Pessoa. O que há que ensinar sobre um gajo que não sabia quem era? Risquei-o logo da matéria. Alguém que ora se chamava Álvaro ora Ricardo não podia ser exemplo para esta nação.
Segundo. Luís Vaz de Camões. Tendo em conta que só tinha um olho não podia ter uma visão abrangente dos assuntos, certo? Pelo menos só viu metade do que aquilo que uma pessoa, chamemos-lhe, normal consegue detectar. Como podia ele falar de uma sociedade quando só via da esquerda até ao ângulo que o seu nariz permitia? Assim, parte do que se passava à sua direita era-lhe desconhecido. Conclusão? Camões nunca mais.
Terceiro. José Saramago. Esse senhor era um extremista, logo seria impossível que vivesse em comunidade. Outro que arrumei para canto. Perguntaram-me então porque tinha ganho um Nobel. Bem, num laivo de raiva despedi quem fez a questão - não obstante se tratasse do primo da minha tia Zira que tinha largado a profissão de coveiro para se juntar à minha assessoria - e expliquei que esses prémios estavam cheios de cunhas, não sendo por isso idóneos.
Quarto. Luís Sttau Monteiro. Também o eliminei da matéria a leccionar para o ano vindouro. Escreveu 'Felizmente há luar' e esse título não é compatível com a nossa política. Luar, lembra noite, que por sua vez me faz pensar em escuridão. Pois o nosso governo bem que pode dispensar o negativismo típico dos portugueses.
Depois analisei a matéria praticada no 11º ano. Um novo desastre.
“Os Maias”? Quem precisa de saber tudo sobre decoração de tempos idos quando o novo design das habitações está acessível na Internet? Além do mais, isto de criticar a sociedade também já passou de moda.
“Frei Luís de Sousa”? Que importa saber de um personagem esquizofrénico que nem sabe a sua identidade mas que tem a mania que é D. Sebastião? Nós precisamos é de ver a luz ao fundo do túnel.
E foi a medo que peguei nos assuntos abordados no 10º ano.
Com desilusão, percebi que estavam lá poemas de gajos que nunca fizeram nada na vida. Levantei-me e disse para todos:
Olhai para mim a ser poetiza,
de tal forma que já estou cheia de fome
tu, Bernardo, manda vir uma piza
que é só ires ao site mandavir.com
O pessoal do staff ficou a encarar-me e eu acabei por me sentar, pensando em todos os disparates que os anteriores ministros da educação fizeram antes de mim. Voltei a explicar que era necessário cativar os jovens com matéria do mundo real e actual e, principalmente, com assuntos que eles sentissem que fizessem parte deles.
Por isso, não saímos de lá enquanto não decidi o que se haveria de leccionar a curto prazo.
As obras obrigatórias passariam a ser as biografias das vidas de José Mourinho e Cristiano Ronaldo, assim como dissertações acerca dos Xutos & Pontapés, do Boss AC, da Teresa Guilherme e do Herman José. Depois ordenei que as composições incidissem sobre a Playstation e a Nintendo. Como poesia, propus as letras da Ágata, do Quim Barreiras e da Miley Cyrus - não que tivesse alguma ligação com Portugal, mas porque Ana, de Hannah Montana, é um nome muito comum por estas bandas, logo o reflexo de muitas jovens. Mas como nem tudo hoje em dia é cultura pura, da forma como sempre conhecemos, também coloquei no programa episódios da vida de gente que ajudou a sejamos aquilo que hoje somos, como o Marco e o Zé Maria do Big Brother, o Zé Cabra da fatiota de lantejoulas, o Hélio que se atira dos skates ou o José Castelo Branco para aqueles que não se identificam com ninguém e se julgam extraterrestres. Para além disso, existirá uma matéria livre sobre o telemóvel que, nos tempos que correm, é aquilo que todos os rapazes e raparigas desejam.
Portanto, tratarei de tornar Portugal num país voltado para o futuro e detentor de jovens dinâmicos e capazes de serem bem-sucedidos por toda a parte.
 
 

1 comentários:

Norma Gondar disse...

A nossa sociedade portanto, em que os "jovens" nem sabem, nem querem saber... o que importa é a me... que aparece na tv !