09/01/2014

CRÓNICAS DE UM PORTUGAL DEMASIADO PORTUGUÊS

CRÓNICAS DE UM PORTUGAL DEMASIADO PORTUGUÊS


CARDOSO – PARTE VII


Como dizia, assisti a um filme inesquecível.
Fiquei tão entusiasmado com ele que decidi alterar o programa da festa da freguesia, que estava sendo preparada há três meses. Subitamente atirei para trás das costas a imagem do santo padroeiro cá do sítio, o São Romão ou o São Roque. Não me recordo bem, mas acho que é um destes porque eu costumava confundir os seus nomes com os das terras de algumas das minhas patroas favoritas. Ainda hoje me recordo daquilo que lhes dizia: Josefina és de são Romão e bates forte no meu coração e Olívia és de São Roque e ficas em brasa só com um toque. Se calhar o raio do santo é o Isidoro, ou essa será a marca das minhas salsichas favoritas? Já nem sei e também não é muito relevante. Afinal, santo só é lembrado quando precisamos dele e os meus paroquianos dão-me tudo o que necessito.
O que importa é que atirei a imagem para trás das costas. Nem se partiu nem nada - o gajo deve ser mesmo milagroso. E depois substituí-o pelo boneco representativo do tal filme que mais recentemente me marcou.
A festa começaria dali a dois dias. Não havia tempo a perder. Avisei toda a gente acerca das mudanças e todos concordaram. Bem, nem todos, mas os que se revelaram contra são agora infiéis, logo não contam. E ficaram cheios de sorte porque a inquisição foi abolida, senão queria vê-los a barafustar.
Portanto, para as novas festividades tive de correr que nem um tolinho. Felizmente o Carnaval estava próximo e consegui encontrar umas indumentárias jeitosas.
O dia chegou e estava tudo em pulgas.
Primeiro apareceu a águia Vitória sobrevoando a praça principal. Como a maioria dos habitantes, ela também vestia um fato, infelizmente pesado demais, pois acabou por se estatelar no chão. Estava disfarçada de pteranodonte.
A seguir foi a vez do rinoceronte que comprei no ebay desfilar pelas ruas da localidade. Tinha colado umas coisas bicudas no dorso para que se fizesse passar por um tricerápoto, pelo que estava perfeito. No entanto o gajo ficou parado sem se mexer, mesmo em frente à fábrica clandestina de sapatos do Quim Zé. Deitou-se no chão e ficou ali de papo para o ar, o inútil. Liguei o facebook no telemóvel. Preparava-me para ameaçar o vendedor quando percebi que os cidadãos se encostavam ao peito do rinoceronte e que iam e vinham com a respiração. Por isso mudei de ideias e não armei um escândalo porque o pessoal parecia estar a gostar.
O terceiro a aparecer foi uma girafa que pedi emprestada ao zoo. Depois um urso cujo fato eu havia roubado numa loja da Natura que falira, um veado emprestado por um caçador americano, um hipopótamo domesticado por um príncipe africano e o rei do jet set do momento. Todos disfarçados de dinossauros.
Eu apareci no fim, mascarado de t-rex. Eu era o maior de todos eles, o verdadeiro predador.
Claro que o filme que eu tinha visto era o “Jurassic Park” e a freguesia lá do sítio passaria a ser a nova terra dos dinossauros. Mal a festa terminou iniciei uma petição para que o nome da terra passasse a Parque Jurássico. O povo gostou da ideia. Claro que eu tinha de pensar num estratagema para que o presidente da Junta se demitisse, pois apesar de ter limpo valetas e alcatroado as estradas o gajo era anão. E um anão não tem lugar de destaque numa terra de gigantes. Talvez servisse noutra população, ou talvez pudesse ser readmitido no ano seguinte, por altura das festas. Afinal sempre quis ver “O Senhor dos Anéis”. Logo de imediato telefonei ao Steven Spielberg para se candidatar à presidência da Junta. Ele recusou, assumindo que já era presidente da Schindler Portugal, uma empresa de elevadores. Mandei-o à merda e depois tentei entrar em contacto com o autor que tinha escrito o livro no qual Spielberg se baseara para fazer o filme. Mandei-o à merda também a ele por não me ter respondido aos e-mails. Acabou por me contactar um gajo qualquer que assumia ser o seu agente. Explicava que o senhor Crichton tinha morrido. Obviamente não engoli essa. Toda a gente sabe que os famosos só ficam famosos depois da sua morte. Era lógico que esse tal Crichton tinha simulado o seu enterro.
Fiquei fodido, mas surgiu-me uma ideia. Lembrei-me lá na minha caixinha de memórias que o Quim Barreiros tinha uma música intitulada de “Meu Dinossauro”. Liguei-lhe mas estava incontactável. Por algum motivo o gajo era mais difícil de encontrar do que o Spielberg. Mandei-o à merda também ele.
E então tomei uma decisão.
Não, eu não me candidataria à presidência.
Eu arranjaria uma senhora presidente, em vez de um homem presidente. Eu chamaria a Dina, a do festival da canção, a que trinca e mete na cesta. A Dina era perfeita, ela seria a rainha-mãe de todos os dinos.


2 comentários:

Guiomar Ricardo disse...

E agora...tan...tan...tan....Realizador,e esta,ein?!
kkkkkkkkkkk

Cristina Torrão disse...

LOL :D