24/10/2013

CRÓNICAS DE UM PORTUGAL DEMASIADO PORTUGUÊS


CRÓNICAS DE UM PORTUGAL DEMASIADO PORTUGUÊS


JEREMIAS – PARTE VI

 
Uns tempos antes de ter trabalhado na noite fui pirata informático. Essa acabou por ser uma das minhas profissões favoritas. Não tinha horários, pagavam bem e tinha tantos clientes que me sentia obrigado a recusar alguns trabalhos. O único contra era que não conhecia gajas novas.
Sempre fui bom com os computadores, quase tão bom como sou na arte de mexer os músculos.
E então aproveitei quando tive a primeira oportunidade de me transformar naquilo que acabei por ser nos meses seguintes.
Certo dia, um amigo de longa data apareceu diante de mim, lixado, dizendo que os filhos do patrão o haviam tramado e que ia ser despedido por causa deles. Eu aconselhei-o que fizesse o mesmo, que os lixasse como vingança. Ele concordou mas assumiu que não conhecia os seus podres, embora achasse que no computador deles haveria provas desses mesmos podres.
Num ápice surgiu a ideia.
Comprei kits de espionagem pela net, descobri passwords e encontrei uma forma de aceder ao pc de cada um deles.
Rapidamente descobri a careca dos filhos do seu patrão. Eram três, dois homens e uma mulher. No computador do mais velho encontrei fotografias dele posando nu junto de carros da polícia, do parlamento, de um turista dormindo na praia, de uma árvore centenária em pleno parque da cidade e até mesmo dentro de um táxi conduzido para um gajo parecido com uma gaja que faz comédia para a televisão. Abona em favor do filho o facto de não ter motivos para se envergonhar dos seus atributos. Em seguida, vasculhei à distância o computador da filha e achei filmes pornográficos caseiros em que ela aparecia com uma série de homens fardados com os fatos da entidade bancária para a qual o meu amigo trabalhara e usando bonés onde se podia ler 'who's the boss, bitch?'. Também consegui encontrar material que pudesse entalar o filho mais novo, pois tinha digitalizado no pc imagens da sua colecção de selos, algo que lhe arruinaria por certo a sua reputação.
O meu amigo abraçou-me com força. Disse-me que os filhos estavam tramados e que um futuro risinho se seguiria: ou seria promovido a chefe ou receberia uma excelente indemnização; caso contrário, eles estavam mesmo tramados. Depois comentou que eu era genial, que fotos e vídeos depravados toda a gente os tem, mas uma colecção daquelas era brilhante para chantagear a família. Até porque o mais novo, o gajo selos, era o mais implicativo deles todos.
E resultou na perfeição.
Não só se tornou vice-presidente da empresa, como se transformou numa espécie de filho adoptivo do patrão, passando inclusivamente a constar no seu testamento. Hoje penso que o velho teria uma série de segredos mais negros do que os filhos. Talvez preferisse jogar snooker em vez de golfe ou não abdicasse de conduzir o seu próprio veículo em vez de requerer os serviços de um motorista. Só escândalos dos grandes, portanto. Todavia nunca cheguei a vasculhar, pois daí em diante eu passaria a ser um profissional no ramo e um gajo, para ganhar nome no mercado, necessita de sigilo e de um rigoroso sentido ético.
Ética é tudo, que o digam as gajas que me passaram pelas mãos. Nunca mencionei o nome delas. Que o diga a Sónia Marmeladas.
Rapidamente a palavra se espalhou. Tornei-me num dos melhores piratas informáticos do mundo.
Armas químicas na Síria? Há décadas que sei disso. Até sei que se encontram no meio do deserto e tudo.
A informação obtida por Julian Assange? Passei metade do que ele expôs em troca de uma gaja sueca, que são difíceis de encontrar.
O espião Edward Snowden? Apenas ficou famoso depois de eu me ter saturado de descobrir os segredos dos outros e me ter reformado de vez.
A pedofilia no Vaticano? Teria imprimido e enviado para os jornais a lista de padres e cardeais implicados, só que não tinha tinteiro que chegasse na altura, e, para ser sincero, sou um homem religioso.
A roupa interior do José Castelo Branco? Bem, isso deixou de ser segredo quando os media decidiram dar-lhe tempo de antena.
A verdadeira identidade do Batman? O Batman não existe, seus tolos, mas já comi a Catwoman. Mia que se farta.
Como disse, fartei-me desta vida e mais ainda quando me sentia perseguido pelos serviços secretos de todo o mundo. Falhados, se ao menos tivessem vida própria não andariam atrás de mim.


1 comentários:

Guiomar Ricardo disse...

kkkkkkkkkkkkkkkkk.................
Falhados!
Jeremias só há um,este e mais nenhum!