12/12/2012

Leitura Conjunta 1984 de George Orwell

1984
Edição/reimpressão: 2007
Páginas: 314
Editor: Antígona
ISBN: 9789726081890



Ana Nunes 

Quando me preparo para ler um clássico, há um certo nível de expectativa sempre presente. No caso de "1984", por ser bastante falado e por quase toda a gente que conheço ter gostado muito dele, ainda mais isso aconteceu. Felizmente foi um daqueles casos em que a opinião da maioria se confirmou. 

O enredo é envolvente, muito detalhado mas sem chegar a ser aborrecido, com cenas maravilhosas que fazem o leitor parar e pensar. As peculariedades do mundo de "1984" são apresentadas de modo gradual, de forma a que o leitor chegue ao final com uma compreensão profunda do que se passa e de como esse mundo funciona, E é impossível não ser 'tocado' por ele, pensar nele, reflectir sobre ele.
A história tem várias reviravoltas e mantém o leitor sempre na expecativa. E aquele final ... sem palavras.
A única coisa que não gostei foi da parte em que o protagonista está a ler um livro e o livro é todo apresentado ao leitor, em texto corrido, num despejo de informação que quase foi demais. 

A nível de personagens, posso dizer que não temos 'pessoas' mas 'tipos de pessoas'. Cada personagem representa um tipo de pessoa diferente, uma forma distinta de enfrentrar o mundo, e dessa forma o leitor pode ver e compreender melhor o mundo em si. O autor permite-nos entrar na mente das personagens e pensar como elas, perceber as suas motivações, talvez até mesmo, deixar que elas nos influenciem de alguma forma, como fazem umas às outras. 

A escrita está belíssima. Há clássicos que são maçudos, mas "1984" não é um deles. Fora a situação que mencionei anteriormente (do livro que despeja informação) todo o restante está muito bem escrito, na dose certa de informação e desenvolvimento, com uma escrita que merece a atenção do leitor. Até mesmo as deixas mais filosóficas chegam a ser brilhantes. 

Em suma, este é um livro que merece sem dúvida o cunho de clássico. Um livro que faz o leitor pensar, reflectir e talvez até mesmo questionar certas coisas que acontecem hoje em dia. Uma história que não só não perdeu impacto com o passar do tempo, como ganhou. Vale a pena! 


Manuel Cardoso 
Eis um livro que marcou indelevelmente a literatura do século XX. É um livro que se lê por vezes de forma dolorosa tal a frieza com que é imaginada uma ditadura impiedosa, que absorve por completo toda a liberdade individual. 

O maior mérito de Orwell foi ter construído todo um sistema político de forma que o leitor o reconhece como possível: essa é a maior força do livro, a tenebrosa sensação de viabilidade de um tal sistema. 

A manipulação da história sempre foi um poderoso meio de fabricar justificações para a ditadura; aqui, na imaginária (ou nem tanto) Oceânia todo o passado é reescrito, para que o presente seja justificado na “verdade oficial” sempre construída à medida dos interessas do regime. Tudo é transformado, adaptado, de forma a eliminar todo e qualquer vestígio de pensamento autónomo. O ideal seria mesmo o “patofalar” (como se diz na língua oficial da Oceânia – a novilíngua). Trata-se de falar sem sair do trivial; sem qualquer raciocínio ou opinião. Só assim se respeitaria a ortodoxia, porque “ortodoxia é ausência de pensamento”. Neste como noutros pormenores o leitor pensa no paralelismo com as “democracias” atuais… o ideal é que os “proles” (85% da população) se limite a trabalhar e reproduzir-se. Mesmo assim sem qualquer prazer, porque o prazer retira as energias necessárias ao culto do regime. 

Como acontece em qualquer outra ditadura, a propaganda e a repressão são os pilares do sistema. No entanto, o aspeto radical da obra reside nisto: propaganda e repressão atingem limites inacreditáveis: a propaganda deve refazer por completo toda a personalidade do súbdito: a Winston é retirado tudo o que o carateriza como ser humano: pensamentos mas também sentimentos. Tudo é reescrito na alma até que o súbdito ame profundamente o Grande Irmão. Para esse fim a repressão reforça o poder da propaganda: uma repressão capaz de destruir corpo mas também alma. 

A Oceânia vive em guerra permanente e pouco importa contra quem; apenas importa que haja guerra porque ela fornece uma razão de ser ao sacrifício individual e à perpetuação do poder. Júlia, a resistente apaixonada por Winston, suspeita que os bombardeamentos da cidade sejam perpetrados pelo próprio governo, para intimidar o povo e manter o ódio ao inimigo. Aliás, toda a sociedade funciona com base no ódio; as próprias crianças são educadas no sentido de cultivarem a delação e a vigilância constante sobre os adultos. 

Em suma, trata-se de uma leitura dolorosa, onde a ficção alimenta no leitor o choque do possível e mesmo de certos aspetos da realidade atual; uma perspetiva pessimista, quase escatológica da humanidade. Um livro que marcou a história da literatura, não tanto pela qualidade literária – que não é excecional – mas pelo significado político e mesmo filosófico do enredo. 


Ângelo Marques 
Winston Smith vive num mundo dividido em três nações (Oceânia, Eurásia & Lestásia) que se equilibram mutuamente mantendo assim uma sustentabilidade com um suporte, muito básico, o suporte bélico. 

A acção decorre em Londres capital da Oceânia que alterna o estado de agressão vs. pacificação entre as outras nações, ora vive em guerra com a Eurásia e confraternar pacificamente com Lestásia como de um momento para o outro a situação se inverte. 

Oceânia é controlada pelo Grande Irmão que tu vê e ouve através dos telecras bidireccionais. O grande Irmão está a implementar uma nova língua a novilíngua, como objectivo fundear uma nova linguagem, linguagem onde se retirará tudo o é passível de ser pensado uma linguagem simples e básica, removendo do cidadão a aptidão do pensamento, pois nem isso constará como parte da novilíngua, este, o grande irmão, alimenta o ódio para com os seus inimigos, num sistema de propaganda imenso.. 

Winston trabalha no ministério da verdade ou MiniVer o ministério que se ocupa das notícias, entretenimento, educação e as artes plásticas. Compete-lhe basicamente reescrever as notícias enviando as notícias antigas para o lixo. Winston, e não só, faz com as noticias o que o partido faz com ele, elimina vestígios do passado reescrevendo o futuro na medida que lhes convêm. 

Nesta sinecura, Winston, que está no centro da pirâmide socialmente estruturada, começa a ter pensamentos e acções de revolta para com o sistema funcional da Oceânia, começa a escrever para O’Brien um “conhecido” de Winston, onde um só olhar fez acreditar no íntimo de Wisnton que O’Brien o compreendia, o medo contrasta com a esperança nos proles, classe social que na imaginação de Winston se revoltará contra o poder totalitarista do Grande Irmão. Mas num determinado momento, Júlia mulher que Winston repudia por pertencer e apoiar fervorosamente o Grande Irmão irá alterar a vida de Winston de forma irreparável ao entregar-lhe um pedaço de papel contendo a palavra... “Amo-te”. 

Oceânia tem como objectivo fundear uma nova linguagem, linguagem onde se retirará tudo o é passível de ser pensado uma linguagem simples e básica, removendo do cidadão a aptidão do pensamento, pois nem isso constará como parte da novilíngua. 

"No seu conjunto, o mundo está hoje num ponto mais primitivo do que à cinquenta anos." 

"A longo prazo, a organização hierárquica da sociedade só seria viável assentando de novo na pobreza e na ignorância." 

"Sem padrões de comparação as massas não se revoltam, pois não sabem se são oprimidas." 

"A mutabilidade do passado é o dogma central da Socing." 

Este tipo de pensamentos recheiam o livro que coloca o leitor num constante rodopio sensorial e emocional, Orwell conseguiu arquitectar uma obra magistral intemporal. 

Este é um livro que nos faz pensar na estrutura social, um livro que nos leva ao essencial que nos leva ao nosso “quarto 101” (quem leu compreenderá quem não leu aqui tem um bom motivo para ler este livro), este livro é uma porta para o mais básico de cada um de nós, mas escrito sempre numa relação de entendimento de afecto, uma espécie de síndrome de Estocolmo, quase poética mas de uma crueldade infinitamente avassaladora. 

Um livro com uma linguagem extremamente simples, desde que inicialmente se interiorize os conceitos da novilíngua, mas com uma aspereza de sentimentos, aqueles sentimentos nus que fazem tremer os nossos alicerces, no final fechei o livro e... apeteceu-me reler o livro. 
Recomendado.


Andreia Silva
Estou rendida ao George Orwell! O homem foi um génio ao escrever este livro (tendo em conta que o livro foi escrito em 1949). Estamos em 1984 e a sociedade é totalmente diferente daquilo que é dito normal. Lembrei-me tanto dos Jogos da Fome, mas não por achar que os Jogos da Fome são uma cópia, até porque o intuito da história é diferente, mas porque este livro é uma distopia brilhante. Nesta sociedade há o Partido e o Grande Irmão (aí está a inspiração para o Big Brother) que comanda tudo e quando digo tudo é mesmo tudo, incluindo os sentimentos, as emoções e as memórias dos cidadãos. Há em todo o lado ecrãs que estão sempre a vigiar, há microfones e pior, há as pessoas que denunciam! E o que mais me enervou foi o facto de se treinarem as crianças para no futuro denunciarem os traidores, mesmo que fossem os pais. Até uma língua nova, o autor inventou! É um livro que mexe, é um livro que revolta e que dá muita raiva, mas é um livro muito bom. Quem leu os Jogos da Fome leia este também!

3 comentários:

Sérgio Amorim disse...

Bem, parece que só falto eu, não é? :P

Bem, não posso dizer muito mais do que já foi dito aqui.

É sem dúvida um dos meus livros favoritos e permitiu-me reflectir sobre aspectos que não me tinham ocupado assim tanto o espírito antes, como o controlo político e como ele pode se reflectir numa sociedade. Também achei muito estimulante a visão de Orwell sobre a linguagem, a história ou as relações humanas . Tudo aspectos que ajudam a definir a cultura e identidade humana, mas que são mais frágeis do que aparentam e se podem tornar instrumentos de repressão.

As personagens neste livro são também muito credíveis. Pessoas comuns, com os seus medos e defeitos, que tentam à sua maneira preservar a sua individualidade.

Quanto à escrita, também só posso deixar elogios. Simples e logo sem excessos estilísticos, o que é perfeito para um livro denso em conteúdo e não quer dizer pobreza na escrita.

Vasco disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Vasco disse...

Também li este livro há pouco tempo. Genial.