18/04/2011

Comentários da 6ª Leitura Conjunta "A Identidade" Milan Kundera

E já estamos na 3ª semana de Abril, tempo de colocar os comentários referentes à sexta leitura conjunta do blogue ;) Como sabem, o livro proposto foi "A Identidade" de Milan Kundera.
Desde já fica o alerta para os spoiler's que os comentários possam conter. Se já leu este livro, comente connosco, partilhe a sua opinião na zona dos comentários deste "post".


Comentário do Ângelo Marques:
Assim a já alguns dias de distância (a meu ver a melhor maneira de remeter uma opinião), lembrando somente aquilo que ficou, se é que ficou alguma coisa, ainda tenho bem presente estes romance.
Uma bela história de amor entre Chantal (mulher bela) e Jean-Marc (jovem amado), Chantal, divorciada após a morte do seu filho, encontra em Jean-Marc um amor que lhe "incendeia" o corpo. Num encontro, previamente marcado, este casal ir-se-á encontrar num hotel ao pé do mar onde Chantal chegará mais cedo, e num passeio pela praia, passando por um estranho acontecimento no bar do hotel, Chantal interioriza para depois o exteriorizar a Jean-Marc que os homens já não se viram para olhar para ela.
E assim de uma pequena frase surge a construção deste belo romance.
A leveza da frase em Jean-Marc contrasta com todo o seu peso em Chantal... todo o livro nasce aqui, após um breve estágio embrionário e com esta frase começam a brotar todas as ideias do autor.
Este relacionamento amoroso após a ingénua frase ...os homens já não se viram para olhar para mim... sofrerá contornos fantásticos. A morte do amigo de Jean-Marc, a quem este nunca lhe perdoou a falta de apoio num momento profissional crítico onde fora despedido, parece um relato afastado e desconectado de toda a história.
Kundera cria um ambiente impressionante, de uma subtiliza única, onde a certo momento a Identidade dos apaixonados se confunde se dilui uma na outra.
Alternando os capítulos, curtos, entre o ponto de vista de Chantal e de Jean-Marc, o autor vai dividindo a história até a mesma se fundir num bloco só. Uma leitura extremamente fácil, mas com um conteúdo fantástico, onde o final surpreende não tanto pelo desfecho da história mas sobretudo pela ambiguidade de quando o sonho foi trocado pela realidade.
Os sentimentos, cruéis, são expostos a uma nudez sensível, erótica, sentimentos brutais expostos sem ferir o leitor. À medida que caminhamos para o final do livro somos levados para um abismo onde a leitura exige de nós um término rápido.
Uma leitura que recomendo. É sem duvida um bom livro!
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Comentário da Di:
It was a little difficult to write a review for “Identity.” After reading it, it kind of left me wanting more, but I have decided that it actually works well just the way it is, in its vagueness, in its briefness and in the unimportance placed on the characters themselves. As I collect my thoughts on this novel, I think that this is not a novel that is about the specifics. And I don’t think this book is really about its characters either. The characters all have certain personalities but there is a certain vagueness about them.
“Identity” is about identity. It is about a person’s identity and how that person’s identity changes over time. The relationship between Chantal and Jean-Marc is always changing throughout the book. And their relationship changes based on weird memories of their past and it also changes because of certain misunderstandings. Chantal and Jean-Marc also seem to change after they fall in love. Love changes people.
An important part in this novel is when Jean-Marc mistakes a stranger for Chantal. This mistaken identity really bothers Jean-Marc. This novel makes a point about our identity being something that is always changing, always transforming, and that we portray different identities to different people. We see this in Chantal’s character: her identity when she is with her colleagues from work is very different from the identity she portrays to Jean-Marc.
Overall I liked this novel. It was short and brief, but very reflective.
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Comentário de Manuel Cardoso:
“Eu tenho duas caras”, afirma Chantal. Duas caras. Todos temos, não é? Duas, três ou quantas forem necessárias. Duas caras mas uma identidade; algo próprio, seja de Chantal seja de qualquer um de nós que nunca se diluirá. É por isso que um casamento, ou uma relação amorosa, por mais profunda que seja, sempre há-de esbarrar na verdadeira natureza humana. A identidade de um ser humano é composta de múltiplas facetas e só a anulação total da personalidade permitiria essa diluição que, ao que dizem, tornaria um casamento feliz. Talvez fosse esse caminho que, neste livro, Jean-Marc procurou: o da anulação da personalidade em nome de uma causa – o amor. Falhou. Falhou como Chantal ou como qualquer ser humano que não consegue (porque não pode) diluir-se nisso a que chamam amor monogâmico.
A monogamia é uma imposição social e histórica; perante ela só há um de dois caminhos: a adaptação ou a revolta. Jean Marc adaptou-se. Pelo menos tentou; ele não se inquieta; apenas se acomoda, passivamente. Acabará mal.
Ela, Chantal, necessita de desafios; necessita de ser ela; de mostrar as várias faces e assumi-las. Acabará mal, também.
O ser humano anseia permanentemente pela liberdade, pela realização do “eu”. No entanto, o amor é algo que conduz a um beco sem saída, a uma quimera que é uma espécie de liberdade a dois. Impossível. Por isso o amor é a negação da liberdade; é a despersonalização.
A verdadeira natureza humana é a do sonho: do sonho libertador, da atracção fatal da liberdade. É entre estes dois pólos (amor e liberdade) que vagueiam Chantal e Jean Marc. Kundera coloca cada um deles num dos pólos. Qual dos dois triunfa? Talvez todos os triunfos sejam provisórios e a vida humana não seja mais que uma viagem hesitante e constante entre os dois.
Trata-se portanto de um livro extremamente simples, com uma mensagem muito clara. Sem a profundidade das sua obras-primas (O Livro do Riso e do Esquecimento e A Insustentável Leveza do Ser) mas com traços de génio na forma simples e directa com que consegue prender o leitor.
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Comentário da Paula:
Penso que com esta história, Milan Kundera alerta-nos para o facto de se perder a identidade quando se ama alguém, ou melhor o casal funde-se formando uma só identidade. Eu pessoalmente não concordo com este conceito. Por mais que se goste de alguém, as pessoas continuam a ter a sua personalidade/identidade. A não ser em casos doentios claro! Mas nesse caso a pessoa em causa perde-se de si mesma!
Apesar da primeira parte da história fazer alusão a esta ideia (identidades que se fundem), o certo é que no decorrer da narrativa, este conceito vai perdendo força uma vez que Jean Marc acaba por trair a confiança de Chantal. Nesta parte da história é evidente a ideia de que as pessoas têm de manter a sua liberdade nas relações, não podem viver em função do outro.
Chantal, que na sua mocidade “queria ser um perfume de rosa, um perfume expansivo e conquistador, queria atravessar assim todos os homens e, através dos homens, abraçar a terra inteira.”, contudo a sua metáfora da aventura adormeceu com o seu casamento e posteriormente com a morte do seu filho. Anos depois de estar com Jean Marc assalta-lhe a ideia de já não ser capaz de chamar a atenção dos homens! Acorda para a realidade com uma certa desilusão. Será que perdeu a identidade de outrora? Embora seja capaz de representar várias facetas, várias identidades, Chantal, deixa de se identificar com aquelas (identidades/facetas) que representa ultimamente. Até que alguém, lhe acende novamente a chama do gosto pela vida e Chantal tenta recuperar a sua identidade perdida…
Este foi o primeiro livro que li de Milan Kundera, não sendo uma obra genial, é uma obra agradável de se ler, cuja mensagem pode ter diversas interpretações.

6 comentários:

Unknown disse...

Parece que desta vez estamos mais ou menos de acordo na interpretação do livro.
No entanto, há aqui alguém que reparou numa coisa interessante: a Di. Gostei dessa perspectiva; de facto, há um certo dinamismo na identidade de cada personagem; há mudanças que são, muitas vezes, desancadeadas pelas mudanças no outro.
Quer a pessoa adopte uma postura de adaptação, quer uma atitude de independência, o certo é que nessa vida a dois, há sempre influências mutuas. Mas também é importante que se diga que essas infuências muitas vezes são exercidas pela negativa, ou seja, "se tu vais para a esquerda, eu vou para a direita" e nesse aspecto achei as atitudes de Chantal bem mais interessantes do que as de Jean-Marc.

Anónimo disse...

Não sei se vi como vocês.
Um casal que se ama intensamente. Chantal e Jean-Marc.
Um dia surgem as primeiras dúvidas quando chantal começa a não acreditar em si mesma porque já não se acha atraente.Está a envelhecer.Já não atrai os homens.Não atrai o seu homem.
O que poderia acontecer a partir daí, pela falta de diálogo, e onde a fantasia fornece fantasmas para o desmoronamento de um grande amor?
Jean-Marc diz a certa altura , quando estão no restaurante e vêem um casal calado "...nenhum amor sobrevive ao mutismo".
Realidade? Fantasia?
Parece-me que para lá de tudo o amor sobreviveu.
Não se perdeu a identidade de um grande amor.

Gostei do romance.

Isabel

Ângelo Marques disse...

Este livro faz-me lembrar um comentário que li à algum tempo sobre Cormac McCarthy, quando lido avulso, assim com muito gelo, porque se fala tanto de Milan Kundera? Será da sua mudança de "identidade" nacionalidade?

Abraços

Paula disse...

Acho que vamos ter de ler mais de Milan Kundera para poder responder a esta tua pergunta Ângelo :)parece-me que este não é o melhor dele.

No início da narrativa parece realmente que os personagens fundem-se numa só identidade, mas com o decorrer do tempo, o real é mais forte e cada um recupera a sua.

"...nenhum amor sobrevive ao mutismo", esta foi uma das frases.

Unknown disse...

Ângelo eu li os outros dois... há uns 20 anos :)
Não me lembro peva a não ser que gostei. Vou reler e depois falamos :)

Paula disse...

... (continuação do comentário anterior) uma das frases que também memorizei (a minha net não anda nada boa...)