CRÓNICAS
DE UM PORTUGAL DEMASIADO PORTUGUÊS
MOUSTAFA
(e Maria e Bruno) – PARTE IV
Eu
tinha 13 anos quando assumi a minha genialidade, primeiro perante a
Maria e o Bruno, depois perante o mundo. Ou melhor, perante as
raparigas da minha turma, mas que não deixava de ser o meu mundo.
Tinha acabado de saber que um tio
meu classificava as namoradas num bloco, dando-lhes estrelas,
consoante aquilo que ele chamava de 'performance'. No início não
soube ao que ele se referia. Deduzi que fosse a arte de cozinhar que
estivesse em avaliação ou, quando muito, a capacidade de responder
'sim' a qualquer questão que ele fizesse.
Durante semanas meditei sobre
isso. Até que, num dia de Páscoa em que se afogou em álcool, eu
tive oportunidade de lhe roubar o bloco para poder tirar as minhas
ilações. Bem, na realidade, sim, ele afogou-se em álcool. Não que
fosse um alcoólico porque nem bebe. Mas estava a assar chouriços e
o Bruno esguichou um pouco de álcool para a mão, depois para o
braço e por fim para o ombro. Ele queimou-se um bocadito, mas hoje
em dia já não se nota - pelo menos quando está vestido. Por acaso
fiz isso de propósito. Peguei numas bisnagas e enchi a minha de água
e a do Bruno com álcool. E pronto, quando as labaredas estavam no
auge - as chouriças tinham muita gordura e tinha sido a Maria que as
fora comprar a meu mando, oferta minha à família com a meia mesada
dela - eu gritei 'embora lá molhar o tio Nel'.
E foi assim. Alguns choraram
outros riram. Na verdade só eu é que comecei por rir, e depois a
Maria e o Bruno. Houve quem tivesse levado o tio Nel ao hospital, se
bem que outros repreenderam o Bruno, lavaram a cozinha ou correram à
vez para o telefone a contar o que tinha acontecido. Esse foi auge da
tarde, pois na sala de jantar eu estava só, no meio das iguarias.
Estávamos ali... eu e o casaco do tio Nel. E adivinhem o que
continha o bolso de dentro do lado do coração? O bloco.
Roubei-o e enfiei-me no quarto a
lê-lo. Fiquei muito chocado na altura porque aquilo não tinha
apenas estrelas. Continha também observações. Uma nojeira
autêntica.
Depois de ter colocado de parte a
hipótese dos cozinhados, conclui que a vida sexual do meu tio estava
exposta ali, de forma crua e rude. E apesar de eu ser inexperiente
nessa área, gostei da parte de expor e descrever as vidas alheias.
Resolvi, por isso, classificar as
miúdas da minha turma, embora nunca tivesse dormido com elas. Diziam
que não eram rãs para gostarem de sapos, algo muito idiota de se
dizer, pois as rãs possuem um ovário vestigial e os sapos não.
Ora, como eu me considero um macho-macho, para ser conhecido como um
anfíbio ao menos que me chamem sapo - sou um sapo e com muito
orgulho. Odeio sapos, mas descobri que odeio ainda mais as rãs.
Não tardou até que a Vanessa, a
Teresa, a Rute, a Ana, a Margarida, a Rita I e a Rita II passassem a
estar na minha mira. Avaliei-as com todo o meu poder. Tirei-lhes as
medidas que nem um alfaiate, penetrei dentro delas que nem o fumo de
um cigarro - cigarro, fumo, cancro... OK, esqueçam esta analogia que
não sou um O-R-C-N-A-C.
Não dormi, portanto, com elas
mas assim imaginei. Quando terminou o ano lectivo já eu tinha uma
escala bem definida acerca das suas potencialidades. A Vanessa era a
mais atrevida, a Teresa a que mais gritava. A Rute gostava de chamar
pelo meu nome e a Ana gostava de variar. A Margarida atirava-se a mim
sempre que estava de barriga cheia, a Rita I adorava lingerie
vermelha e a Rita II queria sempre mais.
Eu era o maior, o mais vivido,
uma espécie de rei da escola, como o meu tio Nel continuava a sê-lo,
excepto quando se deslocava ao hospital para as consultas de
oftalmologia... não, de reumatologia... hum, pediatria? Pronto!
Quando se deslocava para a unidade dos queimados.
Mas
onde estava a genialidade? Pois bem. A minha classificação não se
baseava em estrelas. Isso seria uma coisa muito básica para mim. Eu
inventei uma nova forma de classificar as mulheres. Vocês
conhecessem a triagem de prioridades de Manchester? Claro que não.
Mas é para isso que cá estou, para vos guiar. Esta coisa de
Manchester define o grau de urgência aplicada nos hospitais:
vermelho quando se está para morrer, laranja quando estamos um
bocadinho mal, amarelo para entendermos que somos uns nabos porque
tudo se resolveria com um Ben-U-Ron, verde para sermos gozados pelas
auxiliares e seguranças e azul para passarmos a fazer parte da
paisagem dos serviços.
Pois bem, esse senhor, o senhor
Manchester - ou estará esta designação relacionada com aquela
cidade irlandesa? Hm, irlandesa ou sueca? -, nada inventou!
Quem inventou essa escala fui eu!
Sim senhor! Fui eu!
Eu classifiquei as miúdas
dando-lhes uma cor em função do quão boas elas se revelavam nos
meus sonhos! Por isso, todos os dias, à socapa, fazia cruzes com as
minhas canetas que usava na escola nos casacos ou nas T-shirts delas,
como que marcando-as para todo o sempre. As melhores, a Vanessa, a
Rute e a Rita II levavam com o azul. À Margarida, à Teresa e à Ana
oferecia-lhes a cor verde. Apenas a Rita I merecia o vermelho.
Mais tarde esta forma de
classificar a performance foi espalhada. Tristemente nunca ninguém
me tinha marcado, até que a Maria e o Bruno me levaram um dia ao
paintball e dispararam sobre mim milhões de balas azuis. Esse foi o
dia mais feliz da minha vida.
2 comentários:
Cada vez melhor!!!
Ahahah isto promete!!!!
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