CRÓNICAS
DE UM PORTUGAL DEMASIADO PORTUGUÊS
ROSALINA
– PARTE IV
Na
maior parte dos casos, ir às compras em época de saldos é
humilhante, aproveitar promoções de coisas que ninguém se dá ao
trabalho de adquirir acaba por ser inglório e vasculhar roupas em
fins de stock ou aparelhos electrónicos desactualizados é
impensável no meu modo de vida. Produtos em segunda-mão? Nem
pensar! Brindes? Nunca! Ofertas de variada ordem na compra do que
quer que seja? Isso não é para a Rosalina!
Contudo,
existe uma excepção!
Black
Friday em Londres! Isso sim, tem
pinta. Imagino a vereadora a perguntar onde comprei o perfume que me
dá um cheiro inigualável. Resposta? A capital mais influente do
Reino Unido! Ou a minha vizinha a questionar de onde terá vindo o
casaco de peles que me embelezará. Resposta? De uma loja de onde se
vê o Big Ben. Ou
assim que os juízes invejarem o meu relógio que não se vê à
venda nas ruas portuguesas!
Pois
bem, Black Friday será,
e preparem-se londrinos, que eu vou atacar pelas terras de sua
majestade.
Portanto,
tive o cuidado de ir para o aeroporto na quinta-feira à noite de
sapatilhas, para fazer render a viagem, trazendo apenas uma malinha
de mão que o meu marido carregava. Caso tivesse de fazer muitas
compras, adquiriria também uma mala maior, até porque está a fazer
falta.
Claro
que a companhia aérea que me levou até Londres era low
cost
e, assim, os lugares apertados, o cheiro algo pestilento e o ambiente
impróprio para uma senhora como eu. Mas fez-se bem.
Quando chegámos a Londres
dormimos numa camarata onde cabiam vinte pessoas, parte deles
estudantes, outros aventureiros procurando um trabalho na cidade.
Havia ainda poucos turistas e talvez um par de músicos que
procuravam uma oportunidade para se afirmarem. A casa de banho era
comum a dezenas de pessoas, mas eu nem a usei. Afinal, regressaria ao
final da tarde de sexta-feira.
O
passeio foi extraordinário. Visitámos – eu e o meu marido, que os
miúdos ficaram com a minha cunhada – boutiques,
lojas e centros comerciais. Tudo estava num alvoroço. Gente, só
gente que andava às compras, em Novembro, antes que a época
natalícia estivesse no auge. Tudo estava a correr lindamente, só
que Black Friday
nem vê-la. Não havia coisas baratas nem publicidade alusiva ao mega
evento que vira na Internet um par de semanas antes.
Demos
voltas e mais voltas no meio de
rastafaris,
africanos, punks,
muçulmanos, asiáticos, hippies
e até portugueses, malandros e trabalhadores, portanto. Caminhámos
que nos fartámos e tudo estava ao preço normal. Claro que, apesar
de ganharmos relativamente bem, não nos podíamos esticar. Afinal,
tenho de sustentar o carrão com que o meu marido me transporta, o
colégio dos miúdos e a casa que acaba por ser a melhor da rua.
Por isso, regressei ao aeroporto
inglês com um íman para colocar no frigorífico, daqueles que têm
soldados de roupa preta e vermelha iguais aos reais que fazem o
render da guarda no palácio de Buckingham; uma camisola do Tottenham
comprada nos sírios ou iranianos ou lá o que eram para oferecer ao
filho mais novo da vereadora; e um pisa-papéis em forma de táxi
preto da Austin para que os meus clientes pudessem ver no gabinete.
Quando regressámos ao aeroporto,
estava eu desfeita, um temporal veio de repente. Tivemos de ficar
dois dias lá, por entre bancos, guichês e lojas de restauração.
A viagem acabou por ficar tão
cara quanto pensei, mas sem que tivesse trazido nada de valor.
Mais tarde, voltei à Internet,
para pesquisar aquilo que me levara a pensar que o Black Friday
inesquecível não passava, afinal, de um dia como os outros. E então
percebi. O Black Friday tinha ocorrido numa loja americana
chamada London, e não na cidade de Londres.
Era domingo de manhã quando me
apercebi disso, estava eu em casa. Tinha olheiras e estava com um ar
cansado. Apenas esperei que as laranjas não me fizessem muita azia.
3 comentários:
Olá,Rosalina,mais uma vez!Desta o tiro saiu-te pela culatra...é bem feito para não te armares em esperta!
Está o máximo!
Lol!!! Azedou a viagem...
Lol. Azedou a viagem...
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